domingo, dezembro 13, 2015

nesses dias em que me cérebro vira uma máquina de escrever


Nesses dias em que meu cérebro vira uma máquina de escrever galopante ta tatátátá tatá ta fábrica de histórias E nada passa batido, ileso, incólume. Não escapa pensamento desordenado que não ganhe ordenação na máquina, imagem vira fotografia, vira descrição, narrativa. Eu viro a personagem principal, ou a câmera subjetiva, depende do caso. No carro, a cidade passa tipo filme pela janela, eu a super pilota guio a minha nave e passo batido pela cidade. A cidade que só passa, não me atravessa. Mas a vida nesses dias é estranhamente grande e parece que eu seria capaz de fazer qualquer coisa, eu a super pilota adquiro super poderes e não existe dinheiro, fronteira ou conhecimento que possa me barrar. Eu decolo meu cavalo nave carro, eu salto no ar e sou a protagonista de todos os filmes de todos os cineastas mais legais que já existiram, e de repente eu vivo em nova iorque num loft e pego meu casacão pra ir até a esquina tomar um café com meus amigos porraloucas novaiorquinos artistas fantásticos como eu e tomamos café e depois cerveja e depois whisky e terminamos a noite na casa de um jovem poeta que acabamos de conhecer e ouvimos vinis no tapete do seu studio de janelas grandes sem cortinas com vista pras luzes novaiorquinas que não são como as de São Paulo, são muito muito mais legais porque são novaiorquinas e tudo o que é novaiorquino é mais legal, óbvio. Daí eu visto meu casacão, a minha bota e saio galopando sozinha na rua madrugada bêbada, e meus saltos fazem ta tata tatata ta tata tatata e eu danço tango com os gatos e rio com os caminhantes noturnos e então amanhece e a maquiagem já borrou e eu uso óculos escuros porque sou atriz e vou tomar café da manhã numa esquina charmosa. Mas daí já é Berlim e a câmera subjetiva dos meus olhos capta aqueles jovens malucos estirados na rua no dia seguinte de uma noitada da pesada e está calor. Corta para cenas no parque, Corta para cenas no rio, corta para cenas no metrô, Corta para três jovens encostados num poste enrolando um baseado corta para um flat com chão de madeira, poucos móveis, e um casal trepando alucinadamente. A vida que ainda vamos viver não tem tristeza, angústia, testes, editais, reuniões, brigas, invejas, competição, dinheiro. Não tem dinheiro, Não tem dinheiro, Não tem dinheiro. E não sou eu que não tenho dinheiro é o dinheiro que não tem. A vida que ainda vamos viver não tem passagem aérea, nem visto, nem passaporte. E todos falam todas as línguas e todos se comunicam sem parar e trocam experiências intercontinentais. A vida que ainda vamos viver não tem profissão definida, nem vestibular, nem anos passados na carteira do colégio. Mas tem musica e músicos incessantemente. Tem pessoas que conversam coisas legais e se amam e viajam juntas pelo mundo. Tem cafés da manhã com pão na chapa e café com leite no interior do Brasil, tem Brasil, tem Brasil. Tem cama desarrumada no domingo de manhã. Tem casa de pé direito alto e prédios baixos. Tem cinema o tempo todo e tem teatro e tem textos lindos e legais de serem lidos em voz alta com os amigos. Tem gatos que dançam tango na madrugada com seus saltos de madeira. Tem crianças coloridas de todas as cores que prevêem o futuro e fazem mágicas e nos fazem felizes. Tem fazendas subaquáticas com cavalos marinhos. Tem estrelas no céu e estrelas no chão, na imensidão de uma ilha. Corta para mim. Corta para mim na areia de uma ilha infinita pros dois lados. Corta para mim, estou nua, doida, cor de rosa, eu meus seios cor de rosa e eu dou pequenos pulos na beira da água e canto e falo alto todos os textos que um dia eu decorei. Não tem ninguém ao redor. Só o mar a areia o céu imenso e um pequeno barco ao fundo, quase sumindo no horizonte. E eu sou o barco, a água, a areia. E eu sumo.

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