sábado, outubro 30, 2010

barcelonesa

Cigarro entre os dedos
Maconha na cabeça
Pizza no estomago
Barcelona lá embaixo da varanda do ap da Dorinha

e aqui em cima
no oitavo
(ou átimo, em catalao)
estou eu e só
eu e o cigarro e a maconha e os dois peixes dourados e a tartaruguinha de água que sobrevive com um abajur forjando o seu habitat natural

E eu que nao tenho mais habitat natural

Estou aqui há dois dias e nao vi quase nada da cidade
estive trancafiada gravando um curta metragem com espanhóis, tendo que decorar textos em castelhano (!)

DE fato, estava um pouco cansada de só ver cidades. Agora é bom criar essa mini rotininha que vai durar só dois dias. Depois volto pra maré desrotinada que é a viagem. Que vai e vem. E nao sai de mim, nao sai. Nao acabo de viajar. Navego. Vivo dia a dia. Cada um deles. Devorando o tempo e sendo devorada por ele. Que nao me decifra, mas me devora.

Ahora voy dormir en la cama de dorinha e sonhar suenhos em catalan.

segunda-feira, outubro 25, 2010

nao tem nada mais bonito que as luzes noturnas desta Toulouse singela e divina nas suas ruinhas medievais, nas igrejas grandiosas, na ponte nova mas que é velha muito velha, no seu rio imenso. bom mesmo é andar por essa cidadela a esmo, pairando como as gaivotas aqui do rio, sentindo o vento gelar o rosto e, depois de um tempao vagando, parar para tomar um café quentinho com leite no bistrot pequeno da esquina. Vive Toulouse!

domingo, outubro 24, 2010




que a saudade quando é demais

mata

dias de fúria



Marseille, 23 de outubro de 2010





a lua cheia me sobe a cabeça
mexe com as minhas marés
todos os meus líquidos entramemebuliçao

(((panela de pressao prestes a explodir)))

impressionante a relaçao -direta- que existe entre a lua e as mulheres e isso nao é misticismo, astrologia, calendário maia, tarot - NAO - isso é coisa que acontece aqui dentro de mim mulher, bem aqui, eu sinto uma cólera, um tesao, uma vontade de matar, de morrer, um mau humor, tudo exatamente junto. tudo ao mesmo tempo agora. j'a fui mulher eu sei.

vontade de sair correndo pelas ruas incendiadas de marseille.
vontade de atar fogo nas pilhas de lixo que cobrem a cidade nesta greve junto com os moradores daqui. e deixar queimar.
burn burn burn.
e jogar todos os meus dramas na fogueira.
os meus,
dos meus antepassados,
dos grevistas,
dos aposentados da frança e de todo o mundo.
(este velho mundo que naufraga, lentamente)
e se eu me aproximasse do mar nesta noite? sob esta lua, nesta cidade portuária decadente? se eu mergulhasse em suas águas geladas? neste mar mediterraneo... me entregar. quem me resgataria?
nao.
nem fogo
nem mar.
agora é só esperar passar.

gostei de voce, marseille.
voce é muito maluca.
nao por acaso, foi aqui que nasceu nosso Antonin Artaud.

ele vinha sem muita conversa sem muito explicar
eu só sei que falava cheirava e gostava de mar
sei que tinha tatuagem no braço e dourado no dente
e minha mae se entregou a este homem perdidamente
ele assim como veio partiu nao se sabe pra onde
e deixou minha mae com um olhar cada dia mais longe
esperando parada pregada na pedra do porto
com seu único velho vestido cada dia mais curto
'Minha História' - Chico Buarque

quinta-feira, outubro 21, 2010

de Marseille

PROCUREI INTENCIONALMENTE matar três urubus de fome e de sede no prédio da Bienal de São Paulo. Pus ali imensas latas cheias de tinta escura, para que se afogassem, além de espelhos, para que batessem a cabeça durante o voo. Construí túneis de areia preta, para que entrassem sem conseguir sair, morrendo ali dentro. E, para forçá-los a voar, costumo lançar rojões em sua direção.

Nuno Ramos


é como os homens
urubuzentos
semi mortos
sendo jogados pra todos os lados
keep walking
move
go
work
make money
fuck yourself
kill yourself with work without money
túneis e sequestros
e escuridoes e putrefaçao

.

o fato é que hoje eu daria tudo para estar em outro lugar que nao aqui e agora
quando o melhor lugar do mundo nao é aqui e agora
pior sensaçao que pode existir (é como se eu fosse um urubu na gaiola)
uma rua sem saída
o tempo espaço pode ser tao aprisionador as vezes!
o fato é que tenho ganas de voltar
para minha cidade meu amor meus amigos minha vida meu trabalho
sinto falta pulando dentro do peito da barriga do cérebro
as saudades estao impregnadas, enraizadas, atracadas em mim
as saudades que a esta altura se instalaram e nao querem mais sair - nao há o que as arranque daqui

o fato é que gosto demais da minha vida na minha cidade
ou gostava (nao sei mais se ela será a mesma)
pode ser que nao seja mais, nunca mais, aquela vida que eu vivi na minha cidade

e é melhor que seja diferente mesmo
que quando eu chegue algo tenha mudado
ou eu ou o mundo

ou algo no meu quarto
um cabelo branco na cabeça de uma amiga
um chupao no pescoço do meu namorado
um ladrilho novo quebrado no chao da cozinha
um bar novo na sao luís
uma linha de metro que ficou pronta
será que o sesc belenzinho já abriu?
será que a dilma será eleita?
será que minha cama estará desarrumada?
como meu pai engordou!
meu irmao transformou meu quarto num atelie
meu carro estará com novas batidas?
meu celular voltará a funcionar com o mesmo número?
alguém regou as plantas?
quem usou as minhas roupas?

uma lacuna maior
o vao que separa minha janela do mundo aumentou
os quadros estao escorregando na parede
meus pés nao cabem nestes sapatos
como a cidade está feia!
já nem me lembrava deste vestido
nao preciso de tanta roupa!

quem é voce mesmo, aqui no meu quarto, nu na minha cama?

quero meu lençol de florzinhas
quero meu banheiro
quero me trancar no quarto com voce e nao sair nunca mais
e procurar no seu corpo as marcas novas
e te mostrar meus quilinhos a mais
e contar meus segredos minhas histórias do além mar
meus ingressos que guardei das exposiçoes das peças dos shows dos metros
minha coleçao de isqueiros de cada país
e as moedas
e os presentes
e as roupas novas
e meu cabelo raspado
e minha cara e meu jeito que nao mudam

que medo de encontrar tudo igual cada canto cada enfeite cada voz cada música
que medo de nao te encontrar nunca mais
que nó
quero dormir e voltar a lembrar dos meus sonhos
bonne nuit, marseille.

domingo, outubro 17, 2010

Je suis ici.
A Paris.
A Belle Paris.
Dos sonhos dos filmes dos livros. Ici. Justo aqui.

Viajando com a minha mae, pela primeira vez na minha vida, eu e ela e só. Sem os irmaos que sempre estiveram presentes em todos os momentos.
É o nosso momento. É bonito.
Ela morou aqui quando tinha 24 anos. Eu tenho 24 anos. E a gente se encontrou, na interseccao dos 24, no meio da minha viagem, um oásis, um porto seguro no meio de tudo tao incerto que vivo aqui há dois meses e meio.
É tao bom um pouco de confortável!

Está lindo. É outono, as folhas estao amarelas e eu vendo tudo pela primeira vez. está frio.


E agora eu penso em voce, voce aí, que as vezes me le. É. Voce.

E agora vou dormir.

Estou com os olhos ardendo.

Beijos e boa noite pra Paris.

E
pra
voce.

terça-feira, outubro 12, 2010

... lembrar que saí nesta saga maluca de viagem redescobrimento - uma terceiromundista, mundana de tudo, uma brasileira com amor, aqui nas zorópa de meudeus. Nesse velho mundo lindo foda complexo. Quero é me encharcar. Tenho feito. Tenho amado. E se engordo - depois emagreço. E se bebo diariamente - depois paro. E se nao trabalho agora, é porque tenho toda a vida pra isso. Agora é meu momento de viver me entregar no submarino do além mar, é preciso ir além do bojador para ir além da dor. As pessoas que conheci, as línguas que falei, os lugares onde dormi, os museus, as ruas que atravessei, as comidas que provei, os homens que amei, as mulheres que passaram por mim, as ressacas, as bebedeiras, as noites sem fim, o frio, o calor de berlim, as aulas de suadeira, a morte todos os dias nas camas cada dia uma. Que é como uma aventura hippie. Cada dia num lugar - fluindo fluindo fluindo. E que me importa as roupas sujas no fundo da mala? Que amanha nao sei onde estarei? Que me importa? Que me importa? Me importa que tudo agora é maior, mais potente, dentro de mim uma coisa grande cresce. Uma coisa de contramao de tudo. De que nao estou seguindo o que este sistema absoluto quer que eu faça eternamente: ganhando dinheiro, gerando lucro. Nao. To aqui, viajando, me nutrindo, me abastecendo. Com pessoas maravilhosas que me ensinam todos os dias, nem que seja só uma palavra nova numa língua outra. Mas aprendo sempre. E ensino também.
cambio desligo.


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daí nosso mais-que-perfeito está desfeito.




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Antía es una buenissima anfitria. Me gusta su humor terrible. Las espanholas tenen mucho humor. Me encantan, todas.


y basta por hoy.




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quinta-feira, outubro 07, 2010

londonlondon

a man's heart in a woman's body

...



o cabo da boa esperanca é o mesmo que o cabo das tormentas.

e de qualquer modo, atravessando-o, se chega nas Índias.


...



brincando de cantar alto na rua pra provocar os ingleses silenciosos

cantar alto e cantar em brasileiro, ainda por cima

claro que todos olharam - censurando
ou curiosos
que língua ela canta?

mas ela nem ligou, porque era tao mais forte a caçada do chico buarque

nao conheco seu nome ou paradeiro
adivinho seu rastro e cheiro
vou armado de dentes e coragem
vou morder sua carne selvagem


a fuga, o passeio, o vento, as escadas do metro,
tudo meio que contagia a gente

quando se está na vida, literalmente, só a passeio

pra cima pra baixo, mapa, rua, rostos, línguas, cerveja, objetos, comida, semáforo, corvos, esquilos e raposas

e dá uma coisa grande dentro do peito
coisa imensa
forte
sei lá que nome dar, prefiro chamar de coisa imensa

coisa que as vezes é tao boa
inexplicavelmente boa que me incendeia, que vontade de viver, de ver mais e mais, ver tudo, o mundo - tao lindo o mundo - nao preciso de mais nada, quero viver assim, navegando navegando

noutras vezes
é
coisa
silenciosa
pelas beiradas vai me deixando inteira num estado
de coisa estranha
que nao sei nomear
prefiro chamar de coisa estranha
e tudo perde um pouco o sentido

que que eu to fazendo aqui gastando em pounds comendo doce sem parar. e esse buraco que só cresce? que nao preenche? nunca?

em londres
na turquia
na conchinchina
no himalaia
na argentina
na putaqueopariu


maldito médico que me cortou o umbigo justo no dia em que respirei o ar do mundo pela primeira vez. esse médico me paga.

em pounds, claro.

terça-feira, outubro 05, 2010

Sonhos edimburguenses

sonhei com um homem bravo muito muito bravo e eu correndo de roupa vermelha e branca dizendo NAO NAO QUERO NAO QUERO NAO QUERO NAO NAO E NAO, louca histérica, nao querendo mesmo, gritava com toda a capacidade dos meus pulmoes. Me cansava, e continuava gritando. Muito. Nao sei o que eu nao queria. Mas ele gritava de volta. E uma mulher, uma matrona, uma mulher forte, firme, seca, nos observava. Ela estava e nao estava do meu lado. Depois de um tempo ela se cansava da situacao e se pronunciava. Nao sei o que ela dizia. SOnhei com o eslovaco respondendo meu bilhete. Secretly and silently. Sonhei com uma cena que eu tinha que ensaiar. Sonhei com figurinos.