terça-feira, janeiro 15, 2008

Defeito

Se gostasse de escrever talvez estivesse salva. Sem gastar saliva ruas afora, noites adentro: escreveria cartas. Através de mim passaria o tempo, o sabor, o não saber quase nada. Quem sabe alguém lesse o que escrevo se eu gostasse mesmo de escrever. Talvez o mundo ouvisse as palavras mudas de alguém que precisa se salvar a todo instante. Talvez o mundo salvaria a si próprio, sem a eterna dependência e espera de que alguém o faça. Se escrevesse melhor, as letras se encaixariam perfeitamente; se a perfeição existisse os virginianos seriam perfeitos; se alguém escutasse o som das palavras escorregando no oco do papel a perfeição mal caberia em si. Se entendesse o que escrevo seria Clarice Lispector e não uma reles, defeituosa e cheia de ambições, mortal. Se eu morresse, as palavras ficavam pendidas e tortas no ar. Se eu fosse homem. Não importa o "se" já que ele nunca é e sempre teria sido melhor se fosse de outro jeito. Se não anoitecesse, se não envelhecêssemos, se pudesse prender o ar e todas as palavras viessem `a mim! Que fácil seria gostar de escrever se elas viessem quando mais preciso e eu nem precisaria implorar. Nem me salvar, por supuesto. Salvar os outros tanto faz já que é tarefa árdua e ingrata. Não quero ingratidão nem palavras erradas na hora certa. Meus textos não tem tema e eu nunca sei exatamente sobre o que quero falar, reles, defeituosa e cheia de ambições. Mortal que sou.  

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