sábado, dezembro 09, 2017

Mas quando a gente faz teatro a gente se acostuma com a intensidade e com a vida condensada. Que é tão boa quanto leite condensado. Não, não era isso que eu queria dizer. O lance é que é meio viciante essa vida condensada do palco; é como o forward na hora dos comerciais, ou como a edição nas cenas lentas em que nada acontece. É poder controlar tudo: vamos direto ao ponto sem muita enrolação nas palavras (apenas palavras belas e fortes); podemos cortar as cenas mais doloridas. Tem personagens malucas e inconsequentes que podem dizer o que pensam e fazer o que querem, porque isso não vai durar pra sempre. Tem amor que pode arder porque depois ele se dissolve na coxia. Tem doença que não dói. Tem morte sem morrer. Tem usar o corpo até gastar. Tem um estar presente com a sua energia concentrada no máximo grau. Tem cantar e falar e alternar-se livremente entre as duas coisas sem as pessoas acharem que você enlouqueceu. Tem fazer xixi na frente de todos, tem enfiar a cara na lama, tem se afogar, e falar muito muito alto na cara de todos o que você jamais diria na vida. Na vida não é intenso sempre; na vida tem espera e tem demora e tem ressaca no dia seguinte e tem pílula do dia seguinte e tem nada e tem tédio e tem domingo e tem domingão do faustão e tem cansaço e tem gente que morre de verdade e não posso dizer e nem fazer o quero sempre. Não é legal sempre. Não é emoção e altas aventuras 24 horas por dia.

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